SOBRE O CURSO:
A sociedade contemporânea revela um contexto de progressiva hegemonia do pensamento neoliberal, constituindo uma civilização conduzida pela lógica do mercado e direcionada para o crescimento econômico, a competição, a produção e o consumo. Esse padrão é continuamente alimentado através de veículos midiáticos, com a naturalização da globalização econômica e da expansão do capitalismo como o único sistema viável, apesar da geração de crises crescentes em múltiplas dimensões, incluindo insustentabilidade econômica, desigualdade e exclusão social, discriminação e erosão cultural, degradação ambiental, corrupção e manipulação política, com violências e conflitos generalizados. A imposição desse paradigma alimenta a naturalização da competitividade a qualquer custo, incluindo assassinatos, escravidões, crueldades e indiferenças, dificultando a consolidação de valores e sentimentos verdadeiramente humanos, como cooperação e fraternidade.
Esse contexto de crescente hegemonia da civilização da produção e do consumo não permite a tolerância de culturas que vivem de acordo com outros modos de vida, as quais são vistas como atraso ao progresso e ao desenvolvimento econômico. As instituições universitárias, em geral, repetem um modelo de divisão, hierarquização e monocultura de conhecimentos, onde prevalece o pensamento de origem europeia, abordado como superior a outras formas de compreensão, contribuindo para a depreciação de muitos saberes tradicionais, populares e originários, bem como de suas práticas e valores ecológicos de manejo da natureza.
A educação escolar tende a reiterar esse padrão científico, com currículos padronizados e determinados a nível nacional, tendo sido criada em um formato direcionado para manter o status quo, seguindo em uma tendência a repetir modelos educativos dissociados da realidade, que se manifestam no despreparo para a complexidade da vida e das relações humanas, reforçando a tendência a formar sujeitos individualistas, passivos e alienados. Essa matriz de educação escolar vem privilegiando uma preparação para o mercado de trabalho, deixando de lado outras dimensões essenciais do ser humano, como afetividade, espontaneidade e criatividade, bem como a capacidade de estabelecer boas relações humanas e de lidar positivamente com emoções. Como resultado, além da escola ter dificuldade em contribuir com estes importantes aspectos, também não consegue mais preparar devidamente para uma profissionalização cada vez mais exigente em termos de criatividade, iniciativa, flexibilidade, inteligência emocional e habilidade de estabelecer parcerias e manejar conflitos.
Essa perspectiva seguida na educação ocidental escolar e universitária está desconectada da vida e da ancestralidade, separando ciência e espiritualidade, e se mantendo cega para a verdadeira história e o real significado da vida. São formados profissionais desconectados, que tendem a reforçar modelos de vida e de trabalho destrutivos. Diante de cotidianos que não fazem sentido, na busca de sobrevivência ou de acúmulo de recursos, aumentam os casos de depressão, ansiedade e outras questões psicológicas.
Perante desse cenário, o curso “Licenciaturas Indígenas: Inspirações para reinvenções educacionais e de vida” se fundamenta em uma pesquisa de Doutorado sobre Licenciaturas Indígenas da América Latina, a qual está sendo desenvolvida através do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEdu) da Universidade de Santa Cruz do Sul (UNISC). A programação dessa atividade segue a estrutura proposta pela rota pedagógica da Licenciatura en Pedagogía de la Madre Tierra (LPMT), da Universidad de Antioquia (UDeA) – Medellin/Colômbia, um desenho curricular construído em forma espiralada, permitindo o contínuo aprofundamento dos temas, reflexões e vivências.
Além de trazer conhecimentos, visões de mundo, princípios de vida e pedagogias ameríndias, a proposta proporciona exemplos de estratégias educacionais diferentes e transformadoras que estão sendo desenvolvidas através de outras culturas, com inspiração nas perspectivas do Bem Viver e do Feminismo Comunitário.
Ao trabalhar com aspectos filosóficos, sociológicos, pedagógicos, psicológicos e antropológicos do pensamento indígena e da nossa sociedade, o curso busca evidenciar distintos modos de pensar e viver, desencadeando reflexões sobre nossos modos de vida e possibilidades de mudança. A partir dessas reflexões são proporcionados espaços de discussão para reconstruções e reinvenções em nossos sistemas educacionais e de vida.